“Os lobos
saudáveis e as mulheres saudáveis têm certas características psíquicas em
comum: percepção aguçada, espírito brincalhão e uma elevada capacidade para a devoção.
Os lobos e as mulheres são gregários por natureza, curiosos, dotados de grande
resistência e força. São profundamente intuitivos e têm grande preocupação para
com seus filhotes, seu parceiro e sua matilha. Tem experiência em se adaptar a
circunstâncias em constante mutação. Têm uma determinação feroz e extrema
coragem." (pág. 7)
Esse trecho é
do livro “mulheres que correm com lobos”, da Clarissa Pinkola Estes. Há algum
tempo me debruço sobre ele sempre que ando às voltas sobre questionamentos do
feminino. Traz considerações extremamente interessantes sobre o arquétipo
feminino. Dentro do mundo acadêmico da psicologia, sempre fui mais voltada à análise
do comportamento e não à psicologia junguiana, que estuda mais fortemente a questão
dos arquétipos. Entretanto, na minha vida profissional tentei sempre buscar a
abertura e tentar relacionar outros assuntos à visão de mundo e de homem da
Análise do Comportamento. Afinal, já disse Skinner: “não aceite a verdade eterna,
experimente”. A vida de uma questionadora, curiosa e metida a pesquisadora
perpassa pelas coisas novas que as reflexões nos convidam.
E eis que mais
recentemente, diante de algumas questões que estão acontecendo na minha vida pessoal
e profissional, deparei-me novamente com a leitura desse livro e a reflexão do
ser mulher. O que é ser mulher? Talvez aqui cada uma de nós responda a essa
forma de um modo diferente. Algumas podem trazer questões relacionadas a uma
feminilidade tradicional. Outras, podem refletir que se trata de força e
superação diária frente aos preconceitos enfrentados diariamente em nossa
sociedade. Mas nesses diferentes discursos, não há nada que possamos encontrar
de comum? A forma como cada uma de nós encontra de ser mulher não traz uma questão
comum?
Nesses momentos
eu gosto sempre de me lançar à história. Historicamente, nós mulheres sempre
tivemos uma certa orientação social de como deveríamos nos portar. Afinal de
contas, o que eram as revistas dos anos 50 sobre como a mulher deveria tratar o
marido ou cuidar da casa de uma determinada forma? Houve sempre uma certa
orientação para que estivéssemos à sombra ou à margem de uma sociedade. Mas nem
todas as mulheres comportaram-se assim. Debruçando-se sobre a história de
diversas áreas é sempre possível encontrar mulheres que se dedicavam a fazer
trabalhos que eram, em sua maioria, ocupados por homens. No nascimento de novas
perspectivas, como a química ou a física moderna, a psicologia enquanto
ciência, o cinema, a arte, sempre, se buscarmos, vamos encontrar nomes
femininos no meio de tantos nomes masculinos. Houve tentativas de silenciamento
delas? Claro. Mas elas resistiram. E hoje são resgatadas pelo movimento
feminista como forma de dar visibilidade.
Talvez seja esse
um denominador em comum diante de tantos diferentes discursos sobre o que é ser
mulher. A resistência. Clarissa Estes fala isso ao refletir sobre a mulher
selvagem, ao dizer que uma das características presentes na mulher e no lobo é
a resistência e a força. Ao usar o termo mulher selvagem, a autora reflete
ainda que essas palavras refletem o significado de tocar o instrumento do nome
para abrir uma porta. Abrir passagem. E é isso que nós mulheres fizemos e
continuamos a fazer. Abrir passagens.